quarta-feira, 13 de maio de 2015

Ela não leva tristeza para o trabalho

Miúda, ela parece estar escondida atrás do balcão repleto de queijos e doces. Mas é só o cliente encostar que recebe a saudação dela, acompanhada de um sorriso do tamanho do mundo. Um sorriso que não se desprende nunca do rosto dela. Pelo menos enquanto ela está trabalhando. “Não trago tristeza para dentro do meu comércio”, diz esta paranaense de Mandaguari, que há 40 anos veio para o Mato Grosso, acompanhando o marido e a família dele, e terminou por se fixar em Cuiabá. “É claro que a vida não é só flores, mas quando saio para trabalhar, os espinhos ficam em casa”,
Zilda Ferreira Firmino é uma das mais antigas comerciantes do mercado do Porto. Ela já tinha uma banca na Avenida Beira Rio, endereço dos feirantes antes deles serem instalados no Porto. Contando os 20 anos de existência do mercado mais o tempo anterior, ela tem mais de 30 anos de atividade. E o segredo ela não esconde de ninguém: o bom atendimento. “Tenho freguês de 20 anos”, orgulha-se, acrescentando que são os próprios clientes que indicam o seu comércio para novos compradores.
A Vip Queijaria fornece produtos para restaurantes, churrascarias e pousadas, incluindo vários estabelecimentos em Chapada dos Guimarães. Além dos queijos, comprados diretamente dos produtores, vende doces de leite, de abóbora, de mamão, de laranja, de figo... Esses são produzidos na chácara da família, que fica na estrada de Cáceres, a 50 quilômetros de Cuiabá, na localidade conhecida por Cinquentinha. Às terças-feiras, ou Zilda ou o marido dela se desloca para a chácara para fazer os doces e abastecer os latões e tonéis onde os doces são armazenados para serem vendidos depois, no varejo.
Trabalho, ela tem de sobra. A banca fica aberta ao público todos os dias da semana, inclusive domingos e feriados. E descansa quando? “Aos domingos à tarde”, ela responde com o sorriso de sempre. Também é no domingo à tarde que ela professa a fé em Deus e na igreja católica, levando a família inteira, o marido e os dois filhos, para a missa. “Deus faz milagre na vida da gente”, repete uma Zilda agradecida, uma Zilda que nunca chegou a passar fome, mas já esteve bem perto. “Nos meus tempos de criança, no Paraná, teve épocas em que meus pais faziam de tudo para colocar arroz na mesa para os filhos; quando não conseguiam, apelavam para a quirera, milho quebradinho usado para tratar os pintinhos; quando conseguiam arroz, comiam eles a quirera”.
A casa onde ela mora, no Cristo Rei, em Várzea Grande, não tem nenhum luxo. Mas tem o conforto de um ar condicionado e de um quarto aconchegante, além de uma geladeira abastecida. “Sinônimo de conforto para mim é comer o que eu gosto e dormir bem, numa cama boa, num quarto confortável”, observa a feirante, que pauta sua vida na simplicidade e em jamais pisar no pequenininho.
Aos 62 anos, Zilda se diz “do tempo em que um olhar do pai bastava para conter um filho”. Eram tempos em que prevalecia o respeito. A falta disso, somada à impunidade que campeia à solta, é responsável, segundo ela, pelo crescimento da violência. “Hoje, quem tem dinheiro paga para não ser preso, não importa o crime que tenha cometido, e fica por isso mesmo!”.
Os recursos da informática ainda não chegaram na Vip Queijaria. À moda antiga, o dinheiro vai-se acumulando numa gavetinha de madeira. “Mas eu faço o caixa todo dia”, justifica-se a feirante, que já deu um grande passo no negócio quando legalizou a empresa. Essa é uma vantagem que veio se somar a outras trazidas pela modernidade, como a facilidade de comprar mercadorias. Imagine a comodidade de se comprar, por exemplo, o figo, cuja preparação requer um processo difícil e demorado, e que hoje já vem pré-cozido e entregue na porta! “Hoje também se vende melhor!”.
A rotina de trabalho de Zilda começa às 6h da manhã, quando ela sai de casa, e termina às 19h, quando retorna ao lar. “Não sinto canseira”, diz, cheia de vitalidade, “provavelmente porque gosto muito do que faço”.


3 comentários:

  1. Estes são os verdadeiros heróis do nosso país: os trabalhadores honestos. A maioria deles, infelizmente, permanece no mais completo anonimato, a não ser que alguém como você os descubra para o mundo. Ainda não sei quando, mas o certo é que também quero ir conhecer esta senhora e seus produtos, e, quem sabe, talvez eu me torne cliente dela também.

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    1. E pode contar que ela vai te receber com o maior sorriso do mundo! Ah, e os queijos dela são ótimos. O doce de leite, então...

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  2. me lembro dessa senhora!... foi próprio dela que minha mãe comprou um queijo da última vez que esteve em Cuiabá.

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